Projeto de compensação de espécies ameaçadas de extinção
A escolha da área
A semana anterior foi mesmo bastante corrida e atípica! Foi tão corrida, que ainda não consegui falar de todos os projetos em que eu trabalhei para, então, poder falar do que eu fiz essa semana. Além de ter pegado muito carrapato num campo para um empreendimento de dragagem de areia (Veja aqui), eu fiz um trabalho de campo para atender a um cliente que atua na mineração de minério de ferro no município de Barão de Cocais/MG.
O trabalho que eu realizei consistia em visitar uma possível área para compensar espécies que foram suprimidas durante a instalação do empreendimento e que constam na lista de espécies ameaçadas de extinção. As espécies a serem compensadas foram:
- Dalbergia nigra (Jacarandá-da-Bahia) - espécie vulnerável - Compensação de 10:1
- Cedrela fissilis (Cedro-Rosa) - Espécie vulnerável - Compensação de 10:1
- Apuleia leiocarpa (Garapeira) - Espécie vulnerável - Compensação de 10:1
- Ocotea odorifera (Canela-sassafrás) - Em Perigo - Compensação de 20:1
Conseguir uma área para a compensação dessas espécies tem sido um verdadeiro desafio, a começar pelo elevado número de indivíduos que foram suprimidos durante a fase de instalação do empreendimento. Como para cada indivíduo suprimido precisa ser realizado o plantio de 10 mudas para as espécies vulneráveis e 20 para Ocotea odorifera, a área para plantar todas essas mudas é bem grande.
Além da área necessária, outras dificuldades que estamos enfrentando provém das características ecológicas dessas espécies. Apuleia leiocarpa, Dalbergia nigra, Cedrela fissilis e Ocotea odorifera são espécies de estágios sucessionais mais avançados e, portanto, precisam de sombra para crescer e sobreviver (Carvalho, 2014). Logo, plantios a pleno sol não são uma opção.
Para piorar, Cedrela fissilis tem mais uma característica complicada: ela precisa ser plantada em baixas densidades, 1 indivíduo por hectare, para evitar alta mortalidade em decorrência da broca-do-cedro. Em populações de altas densidades, essa praga pode atacar o meristema apical e os frutos dessa espécie, levando povoamentos inteiros ao fim (Para saber mais, clique aqui).
Portanto, precisávamos de uma área que fosse um fragmento de vegetação não muito impactado e grande o bastante para que pudéssemos plantar todos os indivíduos arbóreos em linhas de enriquecimento. Preferencialmente, esse fragmento deveria estar em uma área protegida (Como a Reserva Legal de algum imóvel); que favorecesse a logística para a realização das atividades de plantio. As áreas anteriores pecaram nesse último quesito.
Vistoria da área em campo
A área que fui vistoriar fica na divisa entre os municípios de Barão de Cocais e Caeté, a poucos quilômetros do empreendimento minerário. Vista por satélite, esse local parecia atender aos nossos requisitos, principalmente logísticos, pois há uma estrada que vai até poucos metros do fragmento.
O fragmento vistoriado estava em estágio avançado de conservação, apesar de um pouco impactado nas bordas devido a um incêndio recente e ter um pouco de espécies invasoras no local. Abaixo, segue uma sequência de fotos da área:
Vista da área à distância
Presença de invasoras e sinais de incêndio recentes
Apesar desses problemas na borda, o interior do fragmento está muito bem preservado. É possível ver uma boa estratificação da vegetação, elevada diversidade de espécies e o sombreamento necessário para as mudas que serão plantadas em linhas de enriquecimento. Como podemos ver abaixo:
Vista do interior do fragmento
Um encontro inesperado: Samambaiaçu de xaxim - Dicksonia sellowiana Hook.
Já faz muito tempo que tenho o desejo de encontrar na natureza a espécie Dicksonia sellowiana conhecida pelo seu nome de Samambaiaçu, uma samambaia de porte arbóreo e que está ameaçada de extinção (EN - Em perigo). Ela foi muito utilizada para a produção de xaxim, uma das muitas causas para que seu status de conservação seja este.
Nunca tinha tido a oportunidade de encontrar uma em meus trabalhos em campo. Entretanto, a espera acabou e meu desejo foi realizado! A área possui um grande número de indivíduos dessa espécie e pude até registrar o momento do meu encontro com um espécime de xaxim.
Indivíduo de Dicksonia sellowiana na área analisada. Identificação de Alexandre Souza.
De volta ao escritório
Após a vistoria da área, constatamos que ela atende aos nossos requisitos para a compensação das espécies arbóreas acima citadas. Portanto, era hora de escrever o PRADA (Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas e Alteradas) para detalhar as técnicas que serão utilizadas e escrever o escopo do projeto.
Para isso, tive que conversar com o proprietário do imóvel à respeito dos impactos que a área de compensação vem sofrendo. Discutimos o cercamento de todo o local, para evitar a entrada de gado e a criação de aceiros.
A metodologia do plantio em linhas de enriquecimento segue o proposto por Martins (2021) e consiste na abertura (quando necessário) de pequenas linhas espaçadas na mata, para plantio de mudas das espécies de enriquecimento no fragmento de vegetação. Foi feita a devida adaptação para as densidades naturais das espécies alvo deste PRADA.
O projeto ainda não foi finalizado pois preciso de algumas informações importantes do imóvel para prosseguir, como o Cadastro Ambiental Rural, o desenho dos polígonos referentes ao imóvel e alguns documentos. Assim que tiver tudo isso, o projeto será finalizado e enviado para aprovação do cliente. Ele dando o aceite, formalizarei o Projeto no processo SEI do empreendimento. Quando isso ocorrer, faço um novo post contando para vocês.
Teve alguma dúvida? Viu algum erro ou link quebrado? Me envie uma mensagem no meu perfil do Linkedin. Sua ajuda é muito bem-vinda!
Referências
CARVALHO, Paulo Ernani Ramalho. Espécies arbóreas brasileiras. 2014. (Clique aqui)
MARTINS, Sebastião Venâncio. Recuperação de áreas degradadas: ações em áreas de preservação permanente, voçorocas, taludes rodoviários e de mineração. Viçosa: Aprenda Fácil, 2021