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Intervenção Ambiental na Mineração de Ferro: Etapas para Obter a Autorização Legal - Parte 1

No último semestre, trabalhei em muitos projetos - muitos deles foram extras: por fora do meu emprego CLT - dentre muitos, vou compartilhar dois projetos de mineração de minério de ferro em Brumadinho com você. Ambos vizinhos, mas sem qualquer conexão entre si. Coincidência? Talvez. Mas o que realmente importa é o que descobrimos no processo. Vou te contar tudo agora.

Caracterização da Área

Os empreendimentos estão situados numa área de Floresta Estacional Semidecidual com diferentes classificações quanto ao uso do solo. Boa parte das ADAs dos empreendimentos são compostas por florestas em estágio médio de sucessão ecológica, enquanto que as demais áreas, encontram-se em estágio inicial de sucessão ou são pastagens abandonadas com árvores isoladas.

Metodologia Utilizada no Inventário Florestal

Assim, o primeiro passo a se tomar foi a delimitação e definição dos usos do solo dentro da ADA, para que fosse possível a definição da metodologia de estudo a ser utilizada. Como esse projeto se trata de supressão de vegetação de mata atlântica em estágio médio de regeneração, foi necessário EIA/RIMA. Quando isso acontece, o processo fica muito mais caro e amplia o tempo necessário para a obtenção da licença devido a complexidade dos estudos que precisam ser feitos.

Porém, como este texto é referente à AIA, não abordarei o EIA/RIMA. Portanto, voltando ao projeto que elaborei, foi definido a utilização de três metodologias diferentes para a elaboração do inventário florestal:

  • método de amostragem em parcelas fixas utilizando Amostragem Casual Estratificada no FESD Médio;
  • parcelas fixas e Amostragem Casual Simples no FESD Inicial;
  • e Censo das árvores isoladas nos locais mais impactados.

Também foi realizado o estudo das espécies herbáceas, para esse tipo de análise utilizamos parcelas de 1m².

Execução do Inventário Florestal

Definidos os usos e as metodologias, chegou a hora de executar o Inventário Florestal que foi bravamente realizado pela equipe de campo (bravamente mesmo, pois foi muito trabalho!!! Parabéns à equipe!). Eu não participei dessas atividades, apenas fiz a análise dos dados. Mas não se engane! Apesar de não ter havido o esforço físico do campo, a minha parte também foi muito trabalhosa. As duas ADAs eram muito grandes e geraram um grande volume de dados para analisar.

Análise dos Dados e Principais Resultados

Dados em mãos e análises feitas, chegou a hora de escrever o projeto e analisar os resultados. Essa área conta com ampla riqueza de espécies e elevada diversidade (mais de 100 espécies arbóreas ao todo e índice de diversidade de Shannon-Wiever igual à 3,49). Este valor para Shannon-Wiever é elevado para áreas de florestas secundárias de mata atlântica, porém, mostra que o local ainda se recupera de um impacto sofrido recentemente ou que os fatores de degradação ainda persistem.

Compensações Ambientais Necessárias

Como era de se esperar em uma área com essas características - elevada riqueza e diversidade -, foram encontradas espécies que: 

 

  • são protegidas e imunes ao corte (Ipês-amarelos);
  • possuem algum grau de extinção e número relativamente alto. As espécies são:

  • Ocotea odorifera 
  • Dalbergia nigra 
  • Aspidosperma parviflorum
  • Cedrella fissilis 

 

Por causa dessas espécies, será necessário o plantio compensatório de uma grande quantidade de indivíduos das mesmas, que acarretou em mais três projetos: PCIA, EITAL, PRADA e um Estudo de conservação dessas espécies in situ. Mas tratarei deles posteriormente.

Para fechar a parte do Inventário, a volumetria de madeira calculada foi bem elevada: 4.602 m³ de madeira e lenha em um, e 2.289 m³ no outro; Com isso, as taxas para os empreendedores foram um pouquinho salgadas… o que não desanimou os responsáveis pelos projetos. Fechado a análise da comunidade arbórea, chegou a hora da vegetação herbácea.

No que se refere a esse tipo de vegetação, o estudo foi um pouco decepcionante: encontramos poucas espécies e uma elevada quantidade de gramíneas exóticas. Embora seja sempre positivo ver uma área bem preservada, esses dados corroboram o resultado encontrado no índice de Shannon-Wiever e evidenciam um histórico de degradação que demanda ações corretivas. Foi justamente essa combinação de resultados – tanto da comunidade arbórea quanto da vegetação herbácea – que indicou a necessidade de elaborar medidas compensatórias robustas que seriam definidas a partir do Projeto de Intervenção Ambiental (PIA).

Mãos à obra! Agora é a vez de escrever o Projeto de Intervenção Ambiental (PIA)

Com todos os dados em mãos, parti para a elaboração do PIA (Projeto de Intervenção Ambiental) que é um dos principais documentos para a obtenção da AIA (Autorização para Intervenção Ambiental). É a partir dele que caracterizamos a região do empreendimento, o imóvel, o histórico de uso, a vegetação que será suprimida e quais as compensações serão necessárias. Lembra das espécies ameaçadas e protegidas que falei agora há pouco logo acima no texto? Pois é, aqui que elas entram. No caso desses dois projetos, as compensações foram:

 

  • Plantio compensatório por supressão de espécies ameaçadas de extinção;
  • Plantio compensatório por supressão de espécies protegidas e imunes ao corte no estado de Minas Gerais;
  • Compensação Minerária;
  • Compensação pela supressão de vegetação nativa do bioma Mata Atlântica.

 

Esses estudos compensatórios foram definidos com base em uma análise detalhada dos dados coletados sobre a vegetação local e nos impactos esperados. Os dados coletados revelam padrões interessantes na composição da Floresta Estacional Semidecidual e indicam desafios específicos para sua conservação. Mas o que esses resultados realmente significam em termos de impacto ambiental e compensação? No próximo artigo, exploraremos como essas informações fundamentaram nossas propostas de compensação ambiental e quais lições esse estudo trouxe para futuras análises

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